O último post do Bruno fez-me pensar em algo que, há não muito tempo, estava conversando com uma amiga minha. A questão do
tempo.
O tempo é algo tão insistentemente fugidio que nos parece completamente caótico no seu correr, assim como um rio corre. Mas até dos rios sabemos que correm para o mar, por isso eu permaneço céptico quando alguém se fica pela subjectividade do tempo. Ou como já dizia o Bernardo Soares, irritam-me as pessoas que pensam que as coisas que acontecem o fazem sem a sua causa devida. Se para onde quer que nos viremos vemos uma razão de ser em tudo na natureza, e sabendo que nós fazemos parte dela, porquê admitir que nós teríamos que ser diferentes de tudo o resto? A lógica da causa e efeito faz sentido nos fenómenos naturais, e porque não em nós também, e naquilo que nos acontece? Talvez as coisas nos aconteçam por alguma razão... (razão essa que desconhecemos).
Mas aquilo que vou falar está ligado ao conceito de tempo. O que é o tempo, afinal, para nós? Falamos tantas e tantas vezes à boca cheia em passado, em presente e em futuro... mas qual é a sua natureza?
Aquilo que é mais fácil começar por analisar é aquilo que está mais perto de nós, e portanto mais acessível. O presente. O presente é o instante em que vivemos, é isto, o "
agora". Definição algo confusa... Mas ajuda dizer que o presente, neste momento, é esta palavra que eu escrevo aqui, e não aquelas que eu escrevi acima. O presente é, acima de tudo, um
momento. E é ainda a única coisa de que podemos ter certeza mais apurada (já não digo verdadeira porque isso envolvia pressupor de que o presente que vivemos é aquilo que realmente existe, coisa que não sabemos).
Qual a natureza do
futuro? Pergunta sem sentido... o futuro é uma projecção, é uma idealização que criamos na nossa mente e que nos permite prever ou formular hipóteses (mais ou menos prováveis) acerca daquilo que nos pode vir a acontecer. Mas qual é a sua verdadeira natureza, isto é, o que é o futuro? Ora, a única resposta que nos pode ocorrer é que o futuro
não passa de uma idealização. Como tal, apenas existe na nossa mente, e não possui qualquer substância, isto é,
é ilusório. Um exemplo simples é o da clássica pergunta que fazemos: então e quando o futuro chegar até nós? Aí já não é futuro, aí já é presente. E como o momento (presente) não é uma projecção, pois não podemos viver algo que ainda não é, resulta que
o futuro não existe. Existe, sim, na nossa mente, mas apenas como ideia ou conceito.
Não tem substância real.Qual a natureza do
passado? Outra pergunta sem sentido... à semelhança do futuro,
o passado não existe. Mas como é isso possível? Simples; à semelhança do futuro, o passado não é mais que uma ideia mental daquilo que um dia foi presente. Convém notar que a única razão que nos faz dizer que há um passado é a nossa capacidade de
memória. Queimem toda a cultura que existe (tudo aquilo que foi criado pelo homem). Matem todas as pessoas que têm conhecimento dessa cultura. O que fica é rigorosamente nada. O passado é um processo mental, uma ideia, um conceito idealizado daquilo que foi, em tempos, presente. Qual a natureza então do passado? Verdadeira? Só pode ser, também,
ilusória...
O facto do passado e do futuro possuirem uma natureza ilusória não retira a sua importância. É importante ter a capacidade para fazer previsões, de modo a conseguir estruturar a nossa vida. É importante ter a capacidade para recordar coisas que nos aconteceram (a nós enquanto pessoas ou enquanto humanidade), porque, de facto, podemos aprender muito com tudo aquilo que já aconteceu. Agora, é preciso ter sempre a mente limpa de qualquer influência que nos diga que o passado ou o futuro são reais. Não podemos agir no futuro, ou agir no passado. Uma conjectura é fruto da mente. E uma memória não pode ser vivida, apenas revivida - mas não modificada. Apenas podemos agir no presente. Assim,
só o presente é real.
Mas, assim, se só o presente é real, faz sentido ficar agarrado quer ao passado, quer ao futuro? A única coisa que temos de mais real possível é o presente. E, ainda assim, ninguém nos deu ainda certeza de que este presente que vivemos é
realmente real, isto é, de que ele
existe, e não é, também ele, uma
ilusão.
Aquilo que o post do Bruno me sugere é isto: será que vale a pena ficar preocupado com o que já aconteceu? Será que vale a pena preocuparmo-nos com o que ainda não aconteceu? O que é importante é que, livre de memórias passadas ou expectativas futuras (que são ilusórias, na verdade), possamos viver
o presente
no presente. Este é o verdadeiro significado do
carpe diem horaciano. Vive o momento, porque é a única coisa que sabes que podes viver (agir).
"Só existem dois dias no ano em que nada pode ser feito. Um chama-se ontem e o outro amanhã, portanto hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e sobretudo viver." (Dalai Lama)